Pesquisadores cobram combate imediato aos incêndios no Pantanal

Maior participação do governo federal no combate imediato às chamas no Pantanal; atualização da legislação para garantir preservação e manejo sustentável do bioma; e construção de estruturas permanentes de combate aos incêndios florestais no Pantanal e em outros biomas foram as ações elencadas em audiência pública virtual realizada nesta quinta-feira (30), pela Comissão Externa destinada a acompanhar e promover estratégia nacional para enfrentar as queimadas em biomas brasileiros.

Essa primeira audiência da Comissão contou com palestras de pesquisadores e cientistas das Universidades Federais de Mato Grosso (UFMT) e Mato Grosso do Sul (UFMS), da Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT) e do Instituto Centro de Vida (ICV); e de profissionais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (IBAMA) e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa/Pantanal).

A atividade foi presidida pela coordenadora da Comissão Externa, deputada Professora Rosa Neide (PT-MT) e pelos deputados Dr. Leonardo (SD-MT) e Vander Loubet (PT-MS). Logo no início dos trabalhos eles passaram à palavra aos pesquisadores, cientistas e profissionais dos órgãos federais.

Em sua apresentação o professor da UNEMAT, Claumir Cesar Muniz afirmou que pesquisas feitas pela Instituição ao longo dos anos apontam que na última década o Pantanal perdeu 16% de sua área úmida. Segundo ele, nesta que é a maior queimada da história, mais de 3 milhões de hectares (23%) do bioma já foram devastados. “O impacto na fauna, na flora será imenso o que agravará a situação de diminuição do bioma”, disse ao afirmar que os incêndios seguem sem controle, especialmente na Reserva Ecológica Taiamã, localizada no município de Cáceres.

Para a pesquisadora da UNEMAT, Solange Ikeda, é urgente o empenho para reversão do processo de seca contínua do Pantanal. Nesse sentido ela enfatizou a necessidade de a legislação alcançar as nascentes dos rios do bioma, como o rio Paraguai. “Hoje falta água no Pantanal para os animais e humanos. Precisamos restaurar as nascentes do planalto pantaneiro. Sem água não há pantanal”, afirmou.

Ao longo da audiência a fala de Solange Ikeda foi corroborada pela deputada Rosa Neide, que apresentou uma foto de uma das lagoas onde nasce o rio Paraguai. “Essa é uma das sete lagoas que compõem a nascente do principal rio do Pantanal. Está localizada entre a cidade de Diamantino e Alto Paraguai. E como vocês podem ver essa nascente está toda desmatada e queimada”, afirmou a parlamentar.

O professor da UFMT e pesquisador do Pantanal, José de Sousa Nogueira, conhecido como Paraná, informou que a Instituição possui vários grupos de pesquisa no bioma, porém falta estrutura para o trabalho. “Precisamos ativar o Instituto Nacional de Pesquisas do Pantanal (INPP). O Pantanal é um ser vivo. Como ele responderá a esses grandes incêndios. A ciência tem que dar essas respostas”, afirmou.

Frentes de fogo

O coordenador do Programa Queimadas do INPE, professor Alberto Setzer, informou que as imagens coletadas por satélite na segunda-feira (28) apontam que há vários quilômetros de frentes de fogo ativos no Pantanal. “Esse fogo deveria estar sendo enfrentado por centenas de milhares de brigadistas e não por pouco mais de 100 bombeiros e voluntários heróicos que temos hoje, mas que por serem poucos não conseguirão fazer frente”, denunciou.

O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) concordou com as palavras do coordenador do INPE e afirmou que a ação imediata que a Comissão Externa precisa continuar cobrando é a participação efetiva do governo federal no combate ao fogo. “Falta maior contingente de brigadistas e fala equipamentos. O governo federal precisa assumir sua responsabilidade para que fogo seja debelado imediatamente”, disse.

O deputado Merlong Solano (PT-PI) e o deputado Doutor Leonardo cobraram maior efetivo das Forças Armadas no enfrentamento das frentes de fogo. “Cadê os brigadistas do exército e os aviões hércules da força aérea? O governo federal ainda não chegou no Pantanal para liderar o combate às chamas”, denunciaram.

Professor Alberto Setzer informou ainda que o INPE vem detectando um aumento no número de queimadas em todos os biomas do País. “Especificamente no Pantanal, em 2019 tivemos um aumento de 300% nos focos de incêndio em relação a 2018. Em 2020 tivemos um aumento de 200% em relação a 2019. Temos em 2020 o maior número de focos já registrados desde 1998, quando o INPE começou a fazer o monitoramento”, disse.

Os incêndios sem controle no bioma tendem a piorar, isso porque segundo a chefe da Divisão da Previsão do Tempo e Clima do INPE, Izabelly Carvalho da Costa, não há previsão de chuvas para as próximas semanas. “E a previsão para os próximos 3 meses é de precipitações abaixo da média em toda bacia do Alto Paraguai e no Pantanal”, disse.

Manejo controlado do fogo

Além do combate imediato dos incêndios com maior mobilização de brigadistas, o coordenador do PrevFogo do IBAMA em Mato Grosso do Sul, Alexandre de Matos, destacou que o bioma precisa de políticas públicas a médio e longo prazo.

“O uso do fogo para a atividade pecuária e para a conservação da biodiversidade é importante para o Pantanal. Mas é preciso regulamentar a partir de respaldo em pesquisas científicas. Não se pode ter fogo zero no pantanal porque se não o problema fica maior”, disse ao defender aprovação de legislação que verse sobre o manejo controlado do fogo no Pantanal.

Para o pesquisador da UFMS, Geraldo Alves Damasceno, “o fogo controlado precisa ser regulamentado porque ajuda a limpar os campos nativos que são utilizados para o gado e isso reduz a quantidade de material orgânico que alimenta os incêndios. Entretanto, o cientista que possui pesquisas sobre a resiliência da vegetação pantaneira ao fogo faz um alerta: o fogo controlado no Pantanal é importante para o manejo, é remédio; mas incêndios fora de controle e nessa proporção que estamos vendo é um veneno para o bioma. Causarão impactos ambientais por décadas.

Mudanças Climáticas

O pesquisador da Embrapa Pantanal, Walfrido Moraes Tomas, ressaltou que a atual situação do Pantanal está inserida no contexto das mudanças climáticas. Segundo ele, devido ao aquecimento global há previsão para o ano de 2070 de redução em 30% em média no volume de precipitações em regiões do hemisfério sul. “A Organização Internacional de Meteorologia fez previsão de secas extremas e ondas de calor para a América do Sul, Sul da África e Austrália, entre os anos de 2020 e 2025”, disse.

“Em relação ao Pantanal já temos uma redução no volume de chuvas de 25% em 2019 e 40% em 2020. Soma-se a isso temperaturas acima da média e seca, o que propicia cada vez mais a ocorrência de eventos extremos como grandes incêndios”, afirmou Walfrido.

O pesquisador citou ainda que a Embrapa tem feito um levantamento da quantidade de animais mortos no Pantanal devido aos incêndios de 2020 “e os dados preliminares que temos são assustadores. O impacto na fauna será devastador”, afirmou. Ele defendeu a ‘atualização da legislação e criação de instrumentos de boas práticas para trazerem as comunidades do Pantanal, pecuaristas, povos indígenas e tradicionais para a lógica da preservação dentro da nova realidade de clima mais quente e seco’.

Investigação

Para o coordenador de Inteligência Territorial do Instituto Centro de Vida (ICV), Vinícius Silgueiro, além da necessidade do combate imediato dos incêndios, da atualização da legislação ambiental e da construção de estrutura permanentes de combate ao fogo é preciso investigar os responsáveis pelos incêndios e promover a responsabilização.

O ICV identificou a origem dos focos de incêndio no Pantanal de Mato Grosso. “Sessenta e oito porcento dos focos de incêndio ativos em meados de agosto tiveram origem em 09 pontos. Destes 09 pontos, cinco são imóveis inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR), imóveis de uso para agropecuária”, afirmou.

“A sensação de impunidade não pode continuar. Ano passado tivemos o dia do fogo na Amazônia. O que ocorreu? Houve responsabilização? O desmatamento e os incêndios são causados porque há uma sensação de impunidade. Isso não pode continuar desta forma”, afirmou.

O deputado Nilto Tatto (PT-SP) corroborou a fala do coordenador do ICV e afirmou que a Comissão Externa precisa investigar “os incêndios criminosos” no Pantanal. Nesse sentido, o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) disse que a Comissão precisa ouvir a Polícia Federal (PF) que tem em curso investigação de incêndios criminosos em propriedades privadas no Pantanal de Mato Grosso do Sul. Por sua vez, o deputado Vander Loubet (PT-MS), disse que os parlamentares cobrarão da PF quais proprietários colocaram fogo no Pantanal. “Não pode haver impunidade”, afirmou Loubet.

Políticas Permanentes

Ao final da audiência, a coordenadora da Comissão Externa informou que dentro do tópico de políticas permanentes para o Pantanal, os parlamentares já estão trabalhando o aperfeiçoamento de dois Projetos de Lei que tramitam na Câmara. O PL 9950/2018 de autoria do deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), que dispõe sobre a conservação e o uso sustentável do bioma Pantanal e dá outras providências; e o PL 11276/2018, do Ministério do Meio Ambiente, que institui a Política Nacional de Manejo Integrado do fogo.

A petista disse ainda que além de continuar cobrando a atuação imediata do governo federal no combate aos incêndios, a Comissão cobrará a implementação de estruturas permanentes de brigadas de prevenção e combate aos incêndios nos biomas brasileiros.

Os deputados: Célio Moura (PT-TO), Marcelo Freixo (PSOL-RJ) e Professor Israel Batista (PV-DF), que compõem a Comissão da Câmara e o coordenador da Comissão Externa do Senado, Wellington Fagundes (PR-MT), também participaram da audiência. 



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